Orelha de livro: "De ombros caídos olhando para o inferno" de Constança Guimarães

09 de novembro de 2017

[Por Micheliny Verunschk]

Está chegando o lançamento do livro De ombros caídos olhando para o inferno da autora Constança Guimarães, que ministra aqui nas Estratégias a Maratona de escrita e é autora do livro A sereia da contorno e outras histórias de ônibus (Leme, 2017). Postamos aqui a orelha do livro, escrita por Micheliny VerunschkO lançamento será na Casa Fiat (Praça da Liberdade, 10), cá em Belo Horizonte, dia 11/11/2017, à partir das 15h.

Quando Hannah Arendt desenvolveu o conceito chamado “banalidade do mal” a partir das atrocidades cometidas em nome do III Reich, o genocídio passa a ser analisado não mais pelo viés da moral e da religião, mas sob a perspectiva política. A opressão de um ser humano por outro é legitimada pelas estruturas sociais dominantes e os crimes perpetrados para manutenção desse status quo são naturalizados.

Ao ler Ombros caídos olhando para o inferno, de Constança Guimarães, o pensamento, incômodo porque instigante, de Arendt, pairou sobre a minha leitura. O machismo e a misoginia, como frutos da estrutura patriarcal, são tentáculos nos quais a banalidade do mal intumesce. No livro, gerações de mulheres são massacradas por único homem que, embora apareça como sujeito de um mal absoluto, só pode criar raízes devido à naturalização social da ideia de que o homem é superior à mulher. O mal absoluto só floresce porque socialmente ele é aceito, seja pela omissão do pai, seja pela conivência aterrorizada de outras mulheres, ou ainda pela galhofa criminosa dos companheiros de trabalho diante da violência.

Não por acaso, este sujeito é denominado como “O Delegado”: ali está uma força repressora e violenta tutelada e fundamentada pelo Estado. Num país em que o feminicídio e a violência de gênero atingem índices alarmantes, a ficção nos leva a fazer perguntas desconfortáveis como que tipo de justiça é possível para vidas continuamente violentadas? Em que território os limites entre justiça e vingança se esgarçam?

Nesse livro em que suspense, exercício de poder e tomada de consciência – e de rédeas do próprio destino – se congregam, a atmosfera é densa e as personagens, que estão à flor da pele, parecem saltar das páginas. Um thriller impossível de largar até a última frase.

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Micheliny Verunschk é autora dos romances O peso do coração de um homem (Patuá, 2017), Aqui, no coração do inferno (Patuá, 2016) e nossa Teresa – vida e morte de uma santa suicida (Patuá, 2014) – projeto com patrocínio da Petrobras Cultural. Também é autora dos livros Geografia Íntima do Deserto (Landy 2003), O Observador e o Nada (Edições Bagaço, 2003) e A Cartografia da Noite (Lumme Editor, 2010). Foi finalista, em 2004, ao prêmio Portugal Telecom como livro Geografia Íntima do Deserto. É doutoranda em Comunicação e Semiótica e mestre em Literatura e Crítica Literária, ambos pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. O romance nossa Teresa - vida e morte de uma santa suicida - ganhou o Prêmio São Paulo de Literatura 2015 - categoria melhor romance de 2015 - autor estreante acima de 40 anos e foi finalista do Prêmio Rio de Literatura 2015. O livro Aqui, no coração do inferno, está finalista do Prêmio Rio de Literatura 2016.