Autopublicação: nossas experiências

12 de agosto de 2016 - Laura Cohen

[Amanhã no Sesc Palladium, 13/08, às 10h30 da manhã, vamos fazer um bate papo sobre livros que foram lançados de maneira independente: Muda, da Karen Corrêa, Vrás, da Carolina Spyer e Minhas férias, da Mariana Zande. Conversaremos sobre estes processos, únicos em cada livro. Neste texto explico um pouco do que é esse processo de fazer livro de forma independente]

Por Laura Cohen*

Quarta-feira passada eu estava sentada com a Flávia Péret no Maletta e passou, como sempre, um desses rapazes que vendem zines. Sempre tenho um pouco de preguiça (principalmente porque 89% das vezes os zines são bem ruins), mas esse cara estava vendo não zines mal feitos, mas um LIVRO e imãs de geladeira com poesias. O resultado do livro era bem profissional e me surpreendeu. Puxando papo com o cara, ele nos falou sobre o seu livro: ele antes vendia zines, e com a grana das pequenas publicações, ele conseguiu fazer um livro de forma independente. Além de fazer livros, ele conseguia viajar com a grana do trabalho dele.

Nós temos que aprender com o exemplo deste vendedor de zines empreendedor e parar de querer publicar o nosso primeiro livro de cara por editoras respeitadas e grandes. Você, obviamente, pode enviar os seus originais para quem quiser, e é bem lindo quando alguém te acolhe, mas isso é raro, demorado, desgastante e difícil. Uma coisa que eu acho muito injusta é que a maioria das editoras não vai respeitar muito o seu desejo com relação ao seu livro e vai fazer uns livros horrorosos. Enquanto há editoras lindas que respeitam total a vontade dos autores, já vi editoras colocando subtítulos idiotas embaixo do título escolhido pelo autor, já vi editora dizendo que o livro não ia ter revisão antes de ser impresso, já vi editoras fazendo projetos gráficos absurdamente ruins. Vai a primeira dica: se imponha, não deixe com que eles façam o que quiserem com o seu texto, coloque tudo no contrato.

Acho que a ideia mais importante é que o seu primeiro livro pode ser uma espécie de cartão de visita, algo que você vai apresentar a outros editores, escritores e pessoas do livro falando: olha, este é o meu trabalho. Ele é legal! E eu tenho mais um livro prontinho para publicar. Quer conferir? Por isso, não precisa ser um livrão: pode ser um livrinho com três contos, uma novela, doze poemas. Os livros da autopublicação são todos seus, então você tem total liberdade de fazer o que quiser com eles.

Então, tendo em vista que a maioria dos livros publicados por aqui na Leme são autopublicação, resolvi fazer um manualzinho:

O texto: olha, se você quer ser escritor, você tem que escrever muito. Como eu fico repetindo e repetindo: escrever é um exercício de desejo e todo escritor tem que ter uma obra original. O que você quer com a escrita? O que seu texto traz de novo? Não dá para fazer um livro com os cinco primeiros poemas que você escreveu, você precisa de um número significativo de textos para poder trabalhar e entender o que é isso que você tá fazendo. Outra coisa importante é receber uma boa edição nos textos. Alguns autores fazem leituras críticas, e aqui no ateliê (momento publicidade) nós temos o serviço de preparação de texto, que consiste em uma leitura atenta do original para que você possa conhecer o seu próprio trabalho, entender pontos fortes e fracos, eliminar o que não é seu e transformar um conteúdo em livro (ou em livros, se você escreve muito!). Eu tenho minhas preparadoras de original e digo que é a coisa que mais vale a pena. Se você não pode pagar pelo serviço, corra atrás das leituras de amigos ou escritores parceiros, em gente que acredita em você. Muitas vezes eu pego projetos simplesmente por acreditar neles.

Revisão: vale uma revisão que respeite os seus desejos como escritor. Se o revisor der muito pitaco errado e te desagradar, demita ele. Se a editora disser que não vai ter revisão, brigue. Mas se lembre que mesmo com todas as revisões do mundo é bem provável que seu livro saia com errinhos. Aliás – uma das minhas diversões é achar errinhos em livros de grandes editoras.

Grana? Outra questão importante é quanto você pode gastar e como você pode gastar. Se você tem grana, problema resolvido, pode fazer o livro como você quiser. Normalmente vendemos os livros por um pouco mais que o dobro do preço de custo da unidade, para que, vendendo menos da metade, você consegue recuperar o que gastou. Nunca vi um livro que não recupera cada centavo do que gastou para produzir e ainda ganha um dinheirinho extra. Use este dinheiro extra para publicar mais um livro, se é que este livro autopublicado não abriu portas para você em outras editoras.

Há outras alternativas, como financiamentos coletivos (lembre-se que dá muito trabalho), pré-venda ou vaquinhas dos amigos. O livro Minhas férias da Mariana Zande foi feito basicamente na vaquinha e na colaboração: 150 cópias impressas com um crédito meu que estava na Oi Kabum!, Mariana fez o próprio projeto gráfico, o ISBN e a ficha catalográfica foram feitos pela Elza Silveira da Impressões de minas sem cobrar nada, o papel custo 120 reais, eu paguei metade, Flávia Perét pagou metade, Thaís Geckseni da gráfica coordenou a impressão, houve um mutirão de acabamento, Bianca de Sá, a mulher da Mari, caprichou na divulgação... E o livro tá aí. Da última vez que conversei com a Mariana, ela me disse que já tinha vendido 70 cópias a 25 reais cada. E estou enchendo o saco dela: guarde essa grana pro próximo livro.

Sou fã de que o livro tem ISBN, que é um número de localização na biblioteca nacional. Com ISBN, seu livro pode ser comercializado em livrarias, e isso é bem legal. Algumas livrarias de rua são bem parceiras e deixam o seu livro em destaque na mesa se você pedir. Dá para você tirar um ISBN de autor, mas acho que o preço dele é bem alto – tendo um ISBN de autor, você pode publicar mil coisas pagando menos na próxima. Procure também editoras pequeninas, cujo trabalho você gosta e invista no seu livro com elas. O projeto gráfico é outra coisa importantíssima: quando você faz um projeto gráfico interessante, não precisa ser capa dura colorido estilo cosac naify, você gasta menos na impressão. Para imprimir, pesquise algumas gráficas interessantes e faça orçamentos. Dependendo da tiragem, será indicado a você o modo de impressão mais em conta. Lembrem-se que quanto maior a tiragem, menor o valor unitário do livro. Uma coisa que eu tenho gostado é a tal da impressão risográfica: tem várias cores, o preço é ótimo pelo tipo de serviço, e as gráficas normalmente são lideradas por pessoas criativas que adoram um baixo custo bonitão. A finada Oi Kabum! tinha uma, e agora temos uma gráfica ótima: a Entrecampo. Antes de publicar seu livro, vale muito a pena ir lá e ver o trabalho dos caras.

Meus livros, como tiveram grande tiragem, foram feitos em offset. O Estratégias Narrativas tem um acordo com a editora Impressões de minas, em que podemos publicar através de offset (tiragens acima de 500) ou digital (abaixo de 500) com um ótimo acompanhamento que super respeita as nossas vontades. O bom de publicar por uma editora mais equipada é que você não precisa se preocupar com o acabamento: grampo, costura, brochura, encadernação, pontinhas arredondadas, orelha... Todo tipo de coisa eles oferecem. Se você for fazer uma tiragem mais baixinha, tipo cem, vale a pena pagar umas cervejas para seus amigos e fazer um mutirão de costura nos livros! Sério: encadernar, se você pega o jeito, é muito fácil.

Mas melhor do que ficar vendendo de bar em bar é fazer lançamentos. As livrarias normalmente cobram 40% do valor de capa pelo serviço, então é bom fugir delas – a não ser que seja uma livraria do seu coração. Alguns espaços culturais, como o Sesc ou as bibliotecas, cedem espaço. Mas gosto muito mais de lançamento em boteco: você fala com o dono, ele te reserva um espaço, todo mundo bebe, come, compra livro, o dono fica feliz, você fica feliz. Alguns botecos até são gente boa e emprestam a maquininha de cartão para você vender seus livros, cobrando o valor que é cobrado a eles pelo serviço. Às vezes vale a pena fazer mais de um lançamento e lançamentos coletivos. No mais, é botar a cara no sol: participe de feiras, faça uma assessoria de imprensa, coloque no facebook, fala para sua mãe avisar a sua família toda dos lançamentos, envie seu livro para pessoas que possam gostar ou para autores que você curte. Eu, por exemplo, enviei meu primeiro livro para o Daniel Galera e ele me citou em uma das colunas que ele escrevia. Coloque-se no mundo como escritor: é um trabalho como qualquer outro.

*Laura Cohen é escritora, formada em letras pela UFMG e mestranda na mesma universidade, na área de literaturas clássicas e medievais. Publicou os romances História da Água (Impressões de Minas, 2012) e Ainda(Impressões de Minas/Leme, 2014). Foi vencedora do segundo prêmio de literatura Universidade Fumec, em 2011, e em sua edição de 2009, obteve o terceiro lugar, publicando nas duas edições da coletânea Da Palavra à Literatura – Narrativas Contemporâneas. Faz parte da coordenação do selo Leme da editora Impressões de Minas, dá ateliês de escrita e possui também trabalhos e pesquisa informais na área de artes plásticas.

Laura Cohen é escritora. Formada em letras e mestre Estudos Literários pela UFMG, publicou os romances História da Água (Impressões de Minas, 2012) e Ainda(Leme, 2014) e Canção sem palavras (Scriptum, 2017), Caruncho (no prelo, impressões de minas, 2022) e as plaquetes de poesia Ferro (Leme, 2016) e Escrever é uma maneira de se pensar para fora (Leme, 2018). Seu romance Caruncho está com lançamento previsto para o segundo semestre de 2021. Foi vencedora do segundo prêmio de literatura Universidade Fumec, em 2011, e em sua edição de 2009, obteve o terceiro lugar, publicando nas duas edições da coletânea Da Palavra à Literatura – Narrativas Contemporâneas. Faz parte da coordenação do selo Leme da editora Impressões de Minas, editando e preparando livros de diversas autoras e autores. Em 2019, participou do ciclo Arte da Palavra do Sesc, dando oficinas em diversas cidades brasileiras. (foto: Bianca de Sá)